Os entregadores de aplicativos promovem hoje (25) a 2ª paralisação nacional da categoria. A primeira foi realizada no dia 1º de julho. Eles reivindicam melhores condições de trabalho, fim de bloqueios indevidos, maior remuneração e apoio para prevenção contra a contaminação durante a pandemia do novo coronavírus.
Os trabalhadores requerem das empresas elevação da taxa mínima e da taxa por quilômetro. Atualmente, eles recebem um valor fixo por corrida e um variável por distância percorrida. Eles argumentam que os dois valores são insuficientes para custear as despesas básicas.
Outro pleito é o fim dos bloqueios indevidos. Entregadores afirmam que são impedidos de continuar prestando o serviço sem explicações. Outra crítica é o fato de que os envolvidos nas paralisações são punidos com esta medida. “Defendemos o fim dos bloqueios. Os caras bloqueia mesmo, aí não quero correr o risco”, relatou um entregador.
O chamado “breque” traz entre suas pautas a adoção de medidas efetivas pelas empresas de proteção no cenário de pandemia. Enquanto algumas empresas forneceram equipamentos e insumos como álcool em gel, outras ainda não tomaram medidas. Eles pedem também um seguro saúde em caso de contaminação ou de acidentes.
Publicações nas redes sociais de grupos de entregadores registravam paralisações marcadas em pelo menos seis unidades da Federação: São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Espírito Santo e Paraná.
No município do Rio, existem cerca de mil entregadores por apps, os que trabalham de motos, bicicletas e por patinetes. A concentração começou às 11h, na Candelária, na região central da cidade. De lá, os manifestantes iriam percorrer os bairros da Glória, Flamengo e Botafogo. Mas, como houve um problema com o carro de som dos manifestantes, apreendido pela Polícia Militar, essa parte do protesto foi suspensa. A outra parte prosseguirá normalmente. O movimento está previsto para terminar às 17h, na Rua Miguel de Frias, em Icaraí, na zona sul de Niterói. Os entregadores vão atravessar a ponte Rio-Niterói para se juntar aos cerca de 500 entregadores de Niterói.
Um dos líderes do movimento, que se identificou como Simões, disse que, devido ao movimento de hoje, os aplicativos estão fazendo promoções de entregas delivery com a finalidade de esvaziar o movimento. E muitos entregadores que estavam bloqueados foram liberados para trabalhar. “Os aplicativos não dão retorno pra gente. A gente quer o aumento da taxa mínima de entrega um seguro de acidentes”, informou.
Simões disse que teve um amigo que fraturou a bacia em um acidente e tentou interceder junto ao aplicativo para conseguir que o tratamento fosse custeado. “A resposta do aplicativo foi de R$ 1mil a R$ 15 mil a gente paga. Vai ao hospital particular dá entrada e depois a vítima será ressarcida. Mas como um de nós vai ter condições de pagar a conta num hospital particular para depois ser ressarcido?”, indagou. E acrescentou: “A gente não quer brigar, a gente quer ser ouvido”.
Em São Paulo capital, os atos tiveram início na parte da manhã, quando núcleos de motoboys espalharam-se por diferentes endereços. Diferentemente da manifestação ocorrida no início deste mês, agora a rota priorizou centros comerciais.
A previsão era de que os protestos fossem realizados na entrada de seis locais: Shopping Tatuapé, Morumbi Shopping, Shopping Center 3, Shopping Center Norte, Shopping União e Shopping Grand Plaza. A orientação dos organizadores era de que os entregadores se concentrassem diante do Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho (Estádio do Pacaembu), às 15h. Por volta desse horário, dirigiram-se para o local, inclusive, alguns entregadores que utilizam bicicletas para trabalhar.
Dessa vez, o Sindicato dos Mensageiros, Motociclistas, Ciclistas e Mototaxistas Intermunicipal do Estado de São Paulo (SindimotoSP), não aderiu à mobilização. A entidade representativa tinha marcado uma audiência de conciliação com 13 empresas de aplicativos, por iniciativa do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região, mas a reunião não pôde ser finalizada, por problemas técnicos. De acordo com o presidente interino do SindimotoSP, Gerson Cunha, não foi definida nova data para o encontro.
Em postagens do Twitter, identificadas com a hashtag BrequedosApps, os manifestantes aparecem diante dos shopping com faixas dizendo "A guerra continua", "Menos bloqueios, mais respeito" e "Brecar até a taxa aumentar". Muitos motoboys também colaram adesivos nas mochilas usadas para transportar encomendas, com dizeres como "Nossa vida valem mais do que os lucros deles."
Paulo Lima - um dos líderes do movimento -, mais conhecido como Galo, afirmou que a agenda de reivindicações vai além de uma melhor remuneração pelos serviços prestados, por exemplo. Conforme afirmou em vídeo que circula pelas redes sociais, a categoria pleiteia vínculo empregatício com as empresas de aplicativos como forma de combater a precarização de trabalho.
Em Brasília, os participantes da paralisação trafegaram pela Esplanada dos Ministérios. Segundo Adriano Sorriso, da Associação de Motoristas Entregadores do Distrito Federal, as reivindicações foram as mesmas da greve promovida no dia 1º de julho, já que as empresas não aceitaram negociar.
“Foram marcadas duas audiências públicas, com o Ministério Público do Trabalho, e os representantes das empresas não apareceram. Até agora não tivemos resposta. Vamos continuar a nossa luta”, comentou o representante da AMAE-DF à Agência Brasil.
Segundo ele, as empresas estariam investindo pesadamente em publicidade criando páginas para desacreditar o movimento e pagando entregadores para gravar vídeos elogiando o trabalho. Mas não houve avanço nos pleitos.
Os entregadores reivindicam aumento da taxa mínima (valor fixo pago a cada corrida) e da taxa por quilômetro. Eles reclamam da falta de transparência e que a remuneração é insuficiente e com a elevação do número de entregadores parte da compensação vem caindo. Outra queixa diz respeito aos bloqueios, que segundo eles ocorrem sem justificativa e sem direito de defesa.
Os trabalhadores defendem também medidas mais efetivas por parte das empresas de apoio à prevenção contra a covid-19. Em Brasília, os entregadores carregavam uma faixa cobrando o fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPIs).
Na avaliação do professor de sociologia da Universidade de Brasília e pesquisador sobre relações trabalhistas Ricardo Festi, o movimento surge como novidade e se destaca por ter ampliado a mobilização e a número de entregadores envolvidos na luta por melhoria nas condições de trabalho.
“Se você avalia as demandas, é o mínimo das condições trabalho. As jornadas são absurdas. Há pessoas que trabalham de bicicleta que ficam de 15 a 16 horas por dia para ganhar R$ 60. Os abusos cometidos pelas empresas estão ficando mais claros. Isso está abrindo um debate nos parlamentos nacional, estaduais e municipais. Há projetos de lei sendo apresentados buscando atender às demandas, o que é também um resultado importante”, analisa.
Nas redes sociais, entregadores e apoiadores passaram o dia divulgando mensagens de apoio e solicitando que cidadãos contribuíssem com o movimento não fazendo pedidos nos principais apps aos quais estão vinculados a maioria dos trabalhadores, como Rappi, iFood, Uber Eats, James e 99Food.
Em nota, o iFood disse que "respeita, de forma incondicional, os direitos democráticos à manifestação e à livre expressão". “A empresa informa que já atende à maioria das reivindicações feitas pelo movimento dos entregadores -- opera com valor mínimo de entrega de 5 reais, independentemente da distância percorrida, distribui equipamentos de proteção individual e para quem não retirou os kits de proteção repassou o valor de R$ 30,00 para compra de materiais, e oferece seguros de vida e contra acidentes. O iFood reconhece que há muito a ser feito e continua, como sempre esteve, aberto ao diálogo."
A Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que reúne, entre outros, o Uber Eats, disse, por meio de nota, que o contexto da pandemia da covid-19 teve efeitos severos sobre a economia, afetando a renda de milhões de brasileiros. “Mesmo diante de um cenário crítico, as empresas associadas à Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (“Amobitec”) que atuam no setor de delivery implementaram, desde o início da pandemia, diversas ações de apoio aos entregadores parceiro, tais como a distribuição gratuita ou reembolso pela compra de materiais de higiene e limpeza, como máscara, álcool em gel e desinfetante, e a criação de fundos para o pagamento de auxílio financeiro para parceiros diagnosticados com covid-19 ou em grupos de risco. Além disso, os entregadores parceiros cadastrados nas plataformas estão cobertos por seguro contra acidentes pessoais durante as entregas”.
No comunicado, a Amobitec disse ainda que “as plataformas de delivery operam sistemas dinâmicos e flexíveis, que buscam equilibrar as necessidades de entregadores, de restaurantes e de usuários. As ações de combate à crise foram desenvolvidas mesmo em um cenário de acirramento da competição entre empresas e aumento expressivo no número de entregadores. Diante de um cenário econômico como o da pandemia da covid-19, a flexibilidade dos aplicativos foi essencial para que centenas de milhares de pessoas, entre entregadores, restaurantes, comerciantes e micro empresas, tivessem uma alternativa para gerar renda e apoiar o sustento de suas famílias”.
É importante esclarecer que as empresas associadas à Amobitec não trabalham com esquema de pontuação para a distribuição de pedidos e deixam claro que respeitam a liberdade de expressão, portanto a participação em atos e manifestações não resulta em punições ou bloqueios de qualquer natureza.
“A Amobitec e suas empresas associadas que atuam no setor de delivery reafirmam a abertura ao diálogo, sempre atentas à realidade dos diversos perfis de entregadores parceiros para aprimorar a experiência de todos nas plataformas”, afirmou.
A Associação Brasileira do Online to Offline (AB020), que congrega startups de mobilidade e delivery, divulgou nota em que afirma não ter havido redução das taxas de administração e que as formas de pagamento são transparentes. Sobre os bloqueios, o comunicado coloca que cada empresa tem seus termos de uso e que cada entregador tem “liberdade de escolha para usar e se vincular a qualquer aplicativo concorrente”.
“A inativação temporária ou, em último caso, o descredenciamento definitivo de um entregador acontece apenas em caso de descumprimento dos termos de uso dos aplicativos. As empresas destacam que não suspendem ou desativam o cadastro de entregadores por participação em manifestações”, pontua a nota.
A AB020 destaca que os aplicativos implementaram medidas de proteção contra a covid-19, como parcerias para garantir consultas médicas por telemedicina, seguro contra possíveis acidentes, distribuição de kits de proteção (com máscaras e álcool gel), disponibilização de um guia de entrega segura.
“A ABO2O respeita o direito à liberdade de expressão e manifestação, dentro dos limites legais, e está sempre aberta ao diálogo com todos os elos da cadeia: entregadores, restaurantes, estabelecimentos comerciais e usuários”, termina o texto. A Agência Brasil perguntou à entidade sobre a negociação com os entregadores e ausência em audiências públicas com o MPT e a representação da categoria e aguarda retorno.
A Rappi informou por nota que fornece seguro contra acidente pessoal, invalidez permanente e morte acidental. A empresa diz que oferece descontos em planos de saúde e restaurantes para os entregadores. Em relação à negociação, a companhia informou por nota que mantinha “grupos focais” para ouvir demandas, mas que estes foram cancelados por hora.
“A Rappi informa que o valor do frete varia de acordo com o clima, dia da semana, horário, zona da entrega, distância percorrida e complexidade do pedido. Ainda, a Rappi possibilita que os clientes deem gorjeta aos entregadores por meio do aplicativo de forma segura e repassa a eles todo o valor pago a título de gorjeta”, respondeu a empresa sobre o pleito de aumento das taxas mínimas e por quilômetro.
› FONTE: Agência Brasil